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Decreto amplia formas de doações para o governo federal, mas empresas devem estar atentas às regras de compliance
COMPLIANCE - 17 DE ABRIL DE 2020
GOVERNO AMPLIA FORMAS DE DOAÇÃO, MAS EMPRESAS DEVEM ESTAR ATENTAS ÀS REGRAS DE COMPLIANCE AO REALIZAREM DOAÇÕES DURANTE A PANDEMIA 

O espírito coletivo e de solidariedade têm sido despertados em razão da pandemia da Covid-19. Inúmeras celebridades, empresas, entidades e cidadãos em geral têm se mobilizado para arrecadar recursos ou doar itens médico-hospitalares para ajudar na crise da saúde. As doações brasileiras para o combate ao coronavírus superam R$ 2,5 bilhões (status de 17 de abril), de acordo com o monitor da Associação Brasileira de Captadores de Recursos (ABCR). As empresas e entidades, no entanto, devem estar atentas ao participar desse esforço.  As doações devem ser  documentadas,  feitas sem intermediações de terceiros e com propósito claro e lícito, mantendo, assim, a conformidade com a legislação aplicável, em especial a lei anticorrupção.

 

Justamente para estimular e ampliar as formas de doações para órgãos e entidades da administração federal, por cidadãos e empresas, foi publicado recentemente, no dia 7 de abril, o Decreto Federal n. 10.314/2020, que permite ao governo receber doações com ou sem ônus ou encargos. Assim, o Governo poderá assumir contrapartida para o recebimento do donativo desde que não envolva compensação financeira. A norma altera o Decreto n. 9.764/2019, que permitia a realização de doações por qualquer pessoa jurídica ou física, nacional ou estrangeira, desde que em situação regular no País, mas sem quaisquer ônus ou encargos para o Governo.

 

Doações

As doações devem ser feitas na plataforma digital do Governo Federal, Reuse (www.reuse.org.br), por meio do Chamamento Público ou de Manifestação de Interesse. No Chamamento Público, quando a administração pública abre um edital expondo o objeto e as especificações da doação que tem interesse em receber, não se pode gerar qualquer ônus ou encargo para o Governo e a gestão dos editais da divulgação fica a cargo da Central de Compras do Ministério da Economia.

 

Já na Manifestão de Interesse, que inclui doações com ou sem ônus para o governo, o usuário deve se cadastrar também no portal Reuse. Após completar o cadastro, basta acessar o site do Reuse e incluir as doações na opção "quero doar". O interessado deve informar sobre o produto ou serviço, anexar fotos e indicar se a doação é para um órgão específico. Ao finalizar, a oferta do doador será analisada pela Central de Compras do Ministério da Economia. Concluída a avaliação, o anúncio do doador será publicado automaticamente pelo Reuse e ficará disponível durante dez dias.

 

As doações aos órgãos e às entidades da administração pública federal direta, autárquica e fundacional serão formalizadas: I- no caso de doação com ônus ou encargo, por meio de contrato de doação. ou II - no caso de doação sem encargos, por meio de termo de doação. O Decreto, em seu art. 26-A, prevê que a inexecução ou mora no cumprimento do encargo, pelo donatário, implicará na reversão da doação. 

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Vedações 

Outro ponto importante do Decreto Federal 10.314/2020 que merece atenção é que é vedada a doação que "gerar obrigação futura de contratação para fornecimento de bens, insumos e peças de marca exclusiva ou de serviços por inexigibilidade de licitação". Ou seja, muita atenção, porque esta proibição tem o objetivo de justamente evitar a contratação futura pela administração pública que beneficie um doador, criando uma situação de concorrência desleal e um drible ao dever de licitar. 

 

Outras situações que a doação é vedada: 2) "quando a doação puder gerar despesas adicionais, presentes ou futuras, certas ou potenciais, tais como de responsabilidade subsidiária, recuperação de bens e outras, que venham a torná-las antieconômicas"; 3) "quando o doador for pessoa jurídica e estiver em débito com a seguridade social"e 4) "quando o ônus ou o encargo exigido for desproporcional ao bem ou ao serviço oferecido em doação, de modo a tornar a doação desvantajosa à administração pública". 

 

O mencionado decreto também proíbe a utilização de bens móveis e dos serviços doados para fins publicitários, na hipótese de haver doação sem ônus ou encargo. Só é permitido a mera menção informativa da doação no site eletrônico do doador e de menção nominal ao doador no site eletrônico do órgão ou do ente donatário da Administração Pública Federal. 

 

Compliance ao doar

As empresas privadas devem adotar medidas que mitiguem eventuais riscos envolvidos nas doações, em especial os previstos nas legislações pertinentes, na legislação anticorrupção e nas boas práticas dos programas de compliance.

 

Prefira realizar uma doação de produtos e serviços, em vez de dinheiro em espécie. Também é preferível e mais transparente optar pela doação sem encargos ou contrapartidas para o Governo. O Chamamento Público é a opção mais recomendada para as empresas que querem doar, dê preferência para esta modalidade. Caso queira doar e não haja o Chamamento Público, as manifestações de interesse podem ser registradas na plataforma Reuse do governo, por meio de uma proposta formal. 

 

Importante ainda é, antes de doar, se certificar se não há nenhum conflito de interesses na seleção do ente público que receberá os recursos doados em função da pandemia. Para minimizar riscos de uso inadequado dos recursos doados, faça uma verificação prévia dos órgãos e pessoas envolvidas no processo (Background Check) e não dê margem para envolver intermediários na doação.

 

Para dar mais transparência para o processo de doação, procure arquivar todos os documentos relativos à doação, inclusive a prestação de contas. As doações sem encargos, conforme previsto no art. 20 do Decreto, é formalizada por meio do termo de adesão. Recomenda-se a inclusão de uma cláusula anticorrupção das partes neste termo de adesão, com previsão de rescisão unilateral em caso de descomprimento.

 

A princípio, o ano de 2020 continua a ser um ano eleitoral, se nenhuma alteração for feita nas datas das eleições municipais. Sendo assim, a empresa precisa estar atenta justamente ao período eleitoral ao realizar suas doações, justamente para minimizar também os riscos do uso inadequado dos recursos doados. Certifique-se que os bens doados não serão utilizados para fins eleitorais ou publicitários de um determinado candidato ou partido. Lembrando que o Decreto só autoriza a menção informativa da doação. 

Perisson Andrade 

Advogado tributarista e corporativo e profissional de compliance com certificação internacional - CCEP-I (Certified Compliance and Ethics Professional - Internacional). Sócio do escritório Périsson Andrade, Massaro e Salvaterra Advogados. Mestrando em Direito Internacional Tributário pelo IBDT. Especializado em Legislação Americana pela George Washington University Law School e pelo IUSLAW Institute, em Direito Societário pelo Ibmec-SP e em Direito Tributário pela FGV.

Luciana Riccó 

Especialização em Compliance pelo Insper-SP, MBA em Marketing pela Fundação Getúlio Vargas (FGV-SP), Especialização em Jornalismo Econômico e Internacional pela Pontifícia Universidade Católica (PUC-SP) e graduação em jornalismo pela Cásper Líbero São Paulo.  Diretora de Comunicação e Consultora de Compliance do escritório Perisson Andrade, Massaro e Salvaterra Advogados.