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O Projeto de Lei 4458/2020, que modifica a Lei de Falências, aguarda a sanção presidencial. O texto altera a Lei 11.101/2005 (que trata de Falências e Recuperações), a Lei 10.522/2002 (que regulamenta o CADIN – Cadastro Informativo de Créditos não Quitados do Setor Público Federal) e a Lei 8.929/1994 (Produtor Rural). O objetivo foi atualizar a legislação referente à recuperação judicial e extrajudicial e à falência.
Uma das mudanças é o aumento do prazo de parcelamento dos débitos com a União das empresas em recuperação judicial, de sete para dez anos. O PL também permite que dívidas trabalhistas sejam incluídas nos processos de recuperação extrajudicial e que produtores rurais pessoas físicas entrem com pedido de recuperação judicial. O projeto também cria mecanismos que aceleram o processo de falência da empresa, com a veloz venda dos ativos da massa falida e célere reabilitação do falido, para que volte a empreender. Esse processo de falência deverá ocorrer em até seis meses. Atualmente, esse processo leva de dois a sete anos.
A proposta aprovada pelo Senado dispõe sobre a recuperação judicial e extrajudicial e a falência; a concessão de empréstimos durante a recuperação judicial; a execução de negociações preventivas entre credores e devedores; a insolvência transfronteiriça e a cooperação entre as Justiças nacional e estrangeira em casos de insolvência transnacional; a possibilidade de suspensão de penhoras durante a recuperação judicial; a recuperação judicial de produtores rurais; a inclusão de créditos trabalhistas na recuperação extrajudicial; o parcelamento de dívidas com a União e a negociação durante período de calamidade pública.
Insolvência transnacional
A Lei de Falências 11.101/2005 não prevê casos transnacionais de insolvência, que são cada vez mais comuns no Brasil. O PL 4458/2020 tem uma série de regras sobre a insolvência transfronteiriça nos moldes da Lei Modelo da UNCITRAL, adotada por muitas jurisdições, tais como Estados Unidos e Europa. Assim, regula a falência e a recuperação judicial de empresas em negócios transnacionais; estimulando a cooperação entre diferentes jurisdições.
A medida é salutar porque regula a falência e a recuperação judicial de empresa que possui negócios em diversos países. Além de auxiliar a colaboração entre juízes, tais normas reduzem a chance de fraude internacional contra credores, bem como protegem o interesse de credores nacionais diante de credores estrangeiros.
Recuperação Extrajudicial
O Projeto busca fomentar o uso da recuperação extrajudicial, com a redução do quórum necessário para se conferir efeitos abrangentes a todos os demais credores, mesmo os não anuentes e com a permissão para que o devedor deduza pedido de recuperação extrajudicial com apoio de apenas 1/3 (um terço) dos credores, enquanto se aguarda a anuência de novos credores.
Conciliação e mediação
A mediação é regido por legislação própria e vem sendo gradualmente utilizada em processos de recuperação judicial. O texto aprovado reforça o uso da conciliação e da mediação no processo de recuperação e falência, com a criação de um mecanismo de suspensão de execuções contra o devedor, por 60 dias, a fim de incentivar a negociação com os credores.Também serão admitidas conciliações e mediações em disputas entre sócios da empresa ou em conflitos envolvendo concessionárias ou permissionárias de serviços públicos em recuperação judicial e os órgãos reguladores ou entes públicos municipais, distritais, estaduais ou federais.
Em períodos de calamidade pública, o texto permite conciliação e mediação para garantir a prestação de serviços essenciais se relativa a créditos que não entrarão na disputa com os demais credores, os créditos extraconcursais.
Stay Period
A legislação atualmente em vigor regula o stay period (período de suspensão de ações contra a empresa em processo de recuperação judicial), marcando o início com o despacho da decisão judicial que recebe o pedido de recuperação e o término em 180 dias após essa data, com suspensão de ações e execuções no período, salvo as de natureza fiscal e as derivadas de contratos de leasing ou propriedade fiduciária. O PL 4.458/2020 mantém essa regra, mas permite que o prazo de 180 dias seja prorrogado por duas vezes, a primeira a critério do juiz e a segunda a critério dos credores. A mudança almeja dar mais previsibilidade aos credores da regra de prorrogação do stay period, com critérios fixados em lei.
Dip financing (debtor in possession financing)
O projeto regulamenta empréstimo para devedor em fase de recuperação judicial. Esse tipo de empréstimo é conhecido como dip financing (debtor in possession financing. Conforme o texto, se autorizado pelo juiz, o devedor em recuperação judicial poderá fazer contratos de financiamento para tentar salvar a empresa da falência. Se a falência for decretada antes da liberação de todo o dinheiro do financiamento, o contrato será rescindido sem multas ou encargos. Esse financiamento poderá ser garantido com bens da empresa, como maquinários e prédios, por meio de alienação fiduciária ou mesmo na forma de garantia secundária.
Plano de recuperação
A possibilidade de que os credores apresentem um plano de recuperação da empresa é outra novidade do PL 4.458/2020. Conforme o projeto, na hipótese de o plano de recuperação judicial do devedor ser rejeitado, a assembleia poderá aprovar prazo de 30 dias para a apresentação, pelos credores, de um plano de recuperação da empresa.
Esse plano deverá cumprir algumas condições, como o apoio de credores que representem mais de 25% dos débitos ou de credores presentes na assembleia que representem mais de 35% dos créditos. Não poderá ainda haver imposição, aos sócios do devedor, de sacrifício de seu capital maior do que viria da falência.
Registro Nacional de Falidos
O Projeto traz regra que determina a união dos registros públicos de empresas e a supervisão do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) para a criação e a divulgação do Cadastro Nacional dos Falidos.
Decretação de falência
A lei em vigor autoriza o Juiz a decretar a falência do devedor por descumprimento do plano com credores privados. Já o Projeto amplia o rol para autorizar o Juiz a decretar a falência do devedor em razão de descumprimento de pagamento em parcelamento de créditos tributários. A falência do devedor também será decretada se, vendida a sua empresa em sede de recuperação judicial, ocorrer a chamada “liquidação substancial”, hipótese de falência travestida de recuperação judicial com o intuito de fraudar credores e que ocorre quando não se preserva, na empresa recuperanda, nenhuma atividade econômica capaz de gerar receitas. O Projeto autoriza o Fisco a pedir a convolação do processo de recuperação judicial em processo de falência, se o devedor der causa injustificada à rescisão de pacto de parcelamento ou de transação.
Venda dos ativos
A Lei em vigor não prevê prazo máximo para a venda dos ativos na falência, enquanto que o Projeto prevê prazo máximo de 180 dias para a venda dos ativos da massa falida e consequente encerramento da falência.
Dívidas tributárias
Outra mudança é a ampliação das possibilidades de parcelamento de dívidas com a União para a empresa em recuperação judicial. O texto aumenta o número de prestações de 84 para 120 e diminui o valor de cada uma. A empresa também poderá quitar até 30% da dívida consolidada e dividir o restante em até 84 parcelas. Para pagar essa entrada, será possível usar 25% do prejuízo fiscal e 9%, 17% ou 25%, conforme o tipo de empresa, da base de cálculo negativa da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL).
Como condições para aderir ao parcelamento, o devedor assinará termo de compromisso pelo qual fornecerá ao Fisco informações bancárias e de comprometimento de valores a receber, além de direcionar ao pagamento da dívida até 30% do produto da venda de bens realizada durante o período de vigência da recuperação judicial.
Caso a empresa deixe de pagar parcelas, se for constatado esvaziamento patrimonial para fraudar o parcelamento ou as condições sejam descumpridas, o parcelamento será cancelado e o débito total exigido.
Também será possível dividir em até 24 meses débitos atualmente proibidos de serem parcelados, como os relativos a tributos com retenção na fonte ou de terceiros (imposto de renda do empregado, por exemplo) e o Imposto sobre Operações Financeiras (IOF).
Transação tributária
O projeto aprovado também prevê o uso de transação tributária, que são acordos para pagamento de dívidas mediante concessão de benefícios. A transação tributária foi regulamentada pela Lei 13.988/2020. Nessa modalidade, o governo ou o devedor propõe descontos para quitar a dívida, que podem chegar a 70% do valor devido, a ser paga em prazo máximo de 120 meses.
No caso de micro e pequenas empresas, o prazo pode chegar a 144 meses. Se a empresa desenvolve projetos sociais, o prazo pode ser aumentado em mais 12 meses.
Segundo o projeto, devedores em recuperação judicial que já tiverem firmado acordos desse tipo poderão pedir a repactuação. O prazo para o pedido será de 60 dias da publicação da futura lei.
Impostos
A Lei nº 11.101, de 2005, não trata de temas tributários em seu texto, mas o Projeto inclui regra tributária que afasta o limite de uso de prejuízos fiscais, conhecido como a “trava” dos 30%, para a determinação da base de cálculo do imposto de renda e da contribuição social sobre o lucro líquido em caso de ganho de capital derivado de alienações de bens em recuperação ou falência, salvo se o adquirente for empresa do mesmo grupo econômico. Assim, o projeto dispensa o devedor de pagar Imposto de Renda e CSLL em caso de ganho de capital derivado de venda de bens em recuperação ou falência, se o adquirente não for empresa do mesmo grupo econômico.
Constatação in loco da existência e funcionamento da empresa devedora
A lei em vigor não possui regra para constatar in loco a existência e o funcionamento da empresa devedora. Já o PL nº 4.458, de 2020, regula esse tema e diz que o Juiz poderá nomear profissional para fazer a constatação.
Créditos trabalhistas na recuperação
judicial e extrajudicial
O projeto permite a inclusão de créditos trabalhistas na recuperação extrajudicial, desde que haja negociação coletiva com o sindicato da categoria profissional. Também amplia o prazo de pagamento dos créditos trabalhistas a contar da homologação do plano de recuperação judicial do devedor, de um ano para dois anos.
Lucros e Dividendos
O PL 4.458/2020 insere na Lei de Falências a proibição de distribuição de lucros e dividendos durante o processo de recuperação judicial. Com isso, o projeto visa garantir que a reserva de lucros seja utilizada para honrar o compromisso do devedor com seus credores ou capitalizar a empresa em recuperação judicial.
Homologação e Pagamento de credores
Atualmente, a lei só permite o encerramento da recuperação judicial após a homologação do quadro geral de credores. Por isso, o projeto permite o encerramento da recuperação judicial antes da homologação desse quadro geral. Os credores que não forem reconhecidos antes do encerramento terão suas ações redistribuídas ao juízo da recuperação judicial como ações autônomas e observarão o rito comum.
Com relação ao pagamento de credores, a lei atual estrutura o pagamento em restituições, créditos extraconcursais e créditos concursais. O Projeto altera a ordem de pagamento dos credores, com preferência para os créditos derivados de dip finance ofertados em recuperação judicial, restituições, encargos da massa falida, créditos trabalhistas limitados a 150 salários mínimos, créditos com garantia real, créditos tributários, créditos quirografários, créditos subordinados e créditos de juros contra o falido. São extintos os créditos privilegiados.
Produtor Rural
O PL nº 4.458/20 autoriza o produtor rural a pedir recuperação, judicial ou extrajudicial, o que os auxilia na recuperação econômica de seus negócios. O texto também retira do rol de créditos sujeitos à recuperação judicial os créditos ou as garantias vinculados às Cédulas de Produto Rural de liquidação física.
A inclusão dos devedores rurais no regime da Lei de Falências foi influenciada por decisões recentes do Superior Tribunal de Justiça (STJ) que reconhecem esse direito ao devedor rural.
A equipe do escritório Perisson Andrade, Massaro e Salvaterra Advogados está à disposição para quaisquer esclarecimentos.